EM FOCO



IDENTIDADE JUDICIÁRIA

*Dilly Leong


  1985 - Guy Georges, um francês originário das Antilhas, condenado em tribunal por violação de uma mulher num parque de estacionamento subterrâneo. Liberto posteriormente, comete cinco homicídios, após violação de diversas mulheres jovens.
  24 de Março de 1998 - Em apenas dois dias de investigações, Guy Georges é detido pela Polícia Judiciária francesa, graças ao trabalho de pesquisa do Departamento de Identidade Judiciária (DIJ), unidade onde não trabalham simples agentes policiais, mas técnicos altamente qualificados.
  O acontecimento, que mereceu as felicitações do Ministro do Interior francês, provavelmente teria sido apenas mais um caso resolvido na estatística policial, se não se tratasse de uma detenção efectuada graças ao trabalho de pesquisa técnica e laboratorial do DIJ, outrora considerado uma simples e pouco eficaz brigada criminal, na qual eram colocados obrigatoriamente os últimos classificados nos cursos da Escola de Polícia Nacional daquele país.
  A ocorrência de tal facto deveu-se à alteração profunda do trabalho efectuado pelo departa- mento, passando da habitual recolha, catalogação, análise e arquivo de impressões digitais, bem como do mero estudo e interpretação de vestígios laboratoriais, para a utilização de exames comparativos do ácido desoxirribo nucleico (DNA) entre bases de dados dos códigos genéticos e as células das vítimas ou dos presumíveis autores dos crimes.
  Actualmente, o Departamento de Identificação Judiciária é considerado um serviço modelo pelos responsáveis da Polícia Judiciária, tendo logrado um primeiro apreço público ao descobrir as provas cruciais para a detenção do assassino de dezanove idosas, mortas em Paris entre 1984 e 1987.
  Composto por duas centenas de técnicos, o Departamento de Identi ficação Judiciária da PJ francesa cobre todo o país, realiza mais de quatro mil investigações anuais e é praticamente auto-sufíciente no seu trabalho: o seu pessoal, quando chamado a intervir, desloca-se aos locais das ocorrências, fotografa, examina, recolhe vestígios e analisa,entregando posteriormenteàs brigadas criminais os correspondentes relatórios ou fotografias-robot num espaço de poucos dias (ver quadro).


  O objectivo imediato do DIJ é conseguir identificar suspeitos em menos de 60 minutos, logo que se crie um ficheiro nacional de códigos genéticos. A tarefa, ainda muito longe de se encontrar concluída, uma vez que depara com forte oposição de muitos políticos, irá certamente permitir, uma vez concretizada a base de dados, a criação de uma mega inteligência artificial ao serviço da polícia.
  No fundo, este Departamento, equiparável a um Laboratório de Polícia Científica, além de utilizar a mais sofisticada tecnologia, baseia também o seu sucesso nagestão e organização dos seus recursos humanos. Os técnicos são altamente qualificados e não se confinam aos abinetes, conduzindo eles próprios a recolha de vestígios. Desta forma, aliando os conhecimentos científicos àprática, proporcionam economia de meios, de material, de tempo e, sobretudo, eficácia na recolha das amostras e correspondente análise.
  O método tem colhido excelentes resultados, sobretudo no tocante à à análise de produtos biológicos, pelo facto de se estimar que apenas existe uma possibilidade num bilião de indivíduos possuírem o mesmo código enético. Assim, vestígios que anteriormente colocavam dificuldades acrescidas na identificação de criminosos, pela sua complexidade, como saliva em pontas de cigarro ou suor contido em roupas, passaram a ser relativamente fáceis de identificar.
  O desejo e interesse em constituir um banco de dados de DNA surgiu também nos Estados Unidos da América, logo após o Reino Unido ter implantado o seu, em 1995. Os EUA demoraram cerca de dez anos a tomar o sistema operacional, uma vez que nem todos os seus cinquenta estados têm uma opinião unânime acerca da sua utilização, sobretudo no tocante aos direitos e liberdades dos cidadãos. Quanto à eficácia do sistema, parece não suscitar dúvidas, uma vez revelar-se menos falível, mais rápido e preciso do que a recolha e identificação de impressões digitais, de tal modo que o Federal Bureau of Investigation (FBI) pretende congregar numa só base de dados, e no mais curto espaço de tempo, todos os códigos enéticos de indivíduos relacionados com os crimes praticados no país.
  Tal interesse e empenho das autoridades explica-se ainda por outras razões, além da fiabilidade do sistema: a partir de agora os velhos e tradicionais artifícios criminosos como a cirurgia estética, destruição da epiderme, desmembramentos ou outros deixam de ser obstáculos incontornáveis para a polícia, pois o DNA é identificável através de quaisquer vestígios biológicos, inclusive de células mortas.
  Outra enorme possibilidade é a detecção e identificação de autores de vários crimes, uma vez que as autoridades possuem o código enético do indivíduo, por simples comparação com a base de dados existente.
  Em Macau, a Polícia Judiciária dispõe do equipamento necessário à à determinação do DNA. O Laboratório de Polícia Científica (LPC) iniciou em 1997 a identificação de DNA em situações de crimes raves, através da técnica denominada PCR (polymerase chain reaction). Tal método, actualmente bastante desenvolvido e eneralizado, tanto pela sua facilidade e rapidez como pelas pequenas quantidades de amostras de produtos orgânicos requeridas, foi também escolhido pela Polícia Judiciária de Macau, tendo em conta as experiências anteriores das outras polícias, após a obtenção de resultados considerados satisfatórios.
  Compete ao pessoal de investigação criminal, em eral, proceder à recolha de amostras na cena do crime para envio ao Laboratório de Polícia Científica.
  No entanto, em situações consideradas mais delicadas o próprio pessoal técnico do LPC desloca-se ao local para o efeito. No primeiro caso, os agentes são formados pelos técnicos do laboratório, uma vez que fazem parte integrante da aprendizagem da disciplina de Polícia Cientifica, ministrada a todo o pessoal de investigação criminal que integra os quadros da Polícia Judiciária, as diferentes técnicas de recolha de amostras de produtos orgânicos no local do crime.
  Sendo uma técnica recente na Polícia Judiciária de Macau, a determinação do DNA não deixa de ser uma das análises mais importantes que a secção de bioquímica do LPC pode disponibilizar para efeitos de investigação criminal.
  Pelo facto de a análise do DNA poder, com elevada arantia, determinar o sexo de indivíduos, e estabelecer com segurança a comparação de produtos orgânicos recolhidos no local do crime com amostras de eventuais suspeitos (sangue, cabelos, saliva, unhas, sémen etc.), para efeitos de eventual identificação, crê-se que esta técnica venha progressivamente a ser ainda mais utilizada e eneralizada na investigação criminal.

O DEPARTAMENTO DE IDENTIFICAÇÃO JUDICIÁRIA DA PJ FRANCESA EM NÚMEROS (1998)


  ·200 funcionários em todo o país, dos quais 50 especialistas em recolha da vestígios.
  ·Mais de 4.000 investigações dfectuadas. Desenho de 300 retratos-robot. ·Recolha de mais de 60.000 fotografias e impressões digitais de indivíduos envolvidos em erimes.
  ·300.000 cópias fotográficas às polícias, Ministério público e Tribunais.
  ·20.000 identificações de sujeitos com dupla identificação.
  ·575 criminosos identificados.

  * Técnica-superior do Laboratório de Polícia Científica da PJ de Macau.