DOCUMENTAÇÃO FRAUDULENTA

* Rui Baleizão


INTRODUÇÃO


  Poder-se-á, em termos gerais,afirmar que o uso de documentação fraudulenta se afigura como uma preocupação determinante das autoridades de cada país, tendo em vista manter a integridade do seu território e salvaguardar o bem-estar da respectiva população.
  Hoje em dia, o planeamento internacional de combate a falsificadores transformou-se de um acontecimento acidental num acontecimento estrutural.
  O combate às falsificações deve ser efectuado de forma estrutural,evidenciando-se a necessidade de cooperação entre os países através dos organismos com responsabilidades nesta área. Esta necessidade baseia-se nos seguintes factos:
  - aumento alarmante do uso de falsificação em documentos com ligações  a círculos  criminais internacionais;
  - aumento significativo do fluxo migratório;
  - diversificação dos grupos de pessoas que cruzam as fronteiras,situação que origina uma grande necessidade de troca de informações;
  - utilização de tecnologia avançada na falsificação de documentos, havendo necessidade de se possuir equipamento compatível, assim como equipas de detecção bem treinadas e bons meios de comunicação entre as entidades com responsabilidades nesta área.
  Por último, é de salientar que as decisões tomadas ao nível da política têm origem no intercâmbio de informação,podendo-se focar como exemplo a abdicação de fronteiras internas num espaço reservado a mais que um país.
  É ainda de sublinhar a estreita conexão entre a utilização de documentos de viagem fraudulentos e outras infracções criminais graves, reconhecendo-se como imprescindível uma estreita cooperação entre os Serviços de Imigração, a Polícia e os fabricantes dos constituintes dos documentos.


DEFINIÇÃO DE DOCUMENTO FALSIFICADO/CONTRAFEITO


  a) Documento de identificação ou de viagem.
  Poder-se-á dizer que documento de identificação ou de viagem é todo o documento autêntico que sirva para certificar a identidade de um cidadão e que lhe possibilite entrar e permanecer durante algum tempo num determinado país ou território, bem como qualquer documento a que a lei de um determinado país atribua força de certificado do estado ou situação profissional das pessoas, e do qual resultem direitos e garantias,designadamente no que toca a subsistência, aboletamento, deslocação,assistência, saúde ou meios de ganhar a vida ou de melhorar o nível de vida.
  b) Falsificação/contrafacção do documento.
  Num conceito lato, é o atributo de toda a representação ou afirmação desconforme com a realidade. Existe uma distinção entre duas espécies de falsificações - a falsificação propriamente dita e a contrafacção ou contrafeição.
  ·Falsificação - Dela resulta um documento parcialmente falso, residindo a falsificação nos pormenores, em acrescentos, alterações das características do documento, diminuição, eliminações e substituições de palavras e/ou números em algumas partes do mesmo, de modo a alterar-lhe a substância e o conteúdo,mas cuja base (papel, cartão, plástico, etc.)é autêntica.
  ·Contrafacção - Falsificação total que abrange o grafismo do documento,incluindo a base ou suporte (fabrico de um documento inteiramente falso).

CAUSAS DO CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO OU DE VIAGEM


  a) A motivação subjacente àfalsificação de documentos de identificação e passaportes está sujeita à lei da oferta e da procura, pois terá que ser naturalmente rentável para que os falsificadores se dediquem a uma actividade que é severamente punida pela lei.
  Como é do conhecimento geral,existem cidadãos que têm dificuldade em obter um documento que lhes permita a entrada e permanência em determinado país ou território. Esta restrição tem em vista conter o aumento significativo do fluxo migratório,engrossado fundamentalmente por indivíduos provenientes de países pobres ou de sistemas políticos extremamente rígidos.
  Outra causa da falsificação de documentos está ligada à obtenção dos mesmos por parte de indivíduos que constam das listas confidenciais de diversos países, os quais se pretendem fazer passar por outro cidadão substituindo a fotografia, mas mantendo o nome e outros dados pessoais de um indivíduo impune em relação à lista negra do país de destino ou de trânsito.As falsificações para situações destas verificam-se não só a nível do documento de viagem mas igualmente do respectivo visto de entrada noutro país.
  Os indivíduos com cadastro a nível mundial, e que estão ligados a infracções tais como contrabando, redes de prostituição, tráfico de armamento e estupefacientes, por norma também viajam com um documento cuja identificação não é a sua.
  b) Macau é, naturalmente, um território que, pelas suas características e localização, se propicia à utilização de documentos falsos por parte de muitos cidadãos que cruzam os postos fronteiriços. Como tal, procurando objectivar o que está mencionado na alínea anterior, ir-me-ei debruçar sobre as causas da falsificação de documentos em Macau:
  ·Dedicação à Prostituição
  O turismo do território de Macau,dotado de características particulares,tem algum prestígio nesta região sudeste da Ásia, por isso, tem atraído muitas cidadãs provenientes da República Popular da China e dos países do Sul e Este da Ásia, que viajam para Macau para se dedicarem à prostituição. Conforme as informações recolhidas nos autos sobre crimes de falsificação de documentos,verifica-se que o maior número de titulares de documentos falsos é do sexo feminino, tendo como finalidade última a prostituição.
  ·Diferença de Nível de Vida entre Regiões
  Existe um grande desnível entre a economia da República Popular da China e a do Território de Macau, facto que leva os cidadãos do interior da China a sair da sua terra à procura de melhores condições de vida, sendo Macau um dos lugares mais cobiçados.
  Obviamente, esta situação não ocorre só em relação aos chineses vindos da RPC, mas também com os cidadãos vindos de outros países e regiões, tais como as Filipinas, a Tailândia, etc.
  ·União Familiar
  Existe uma relação íntima e forte entre os residentes da RPC e os de Macau.Anualmente, aproximadamente 1500 pessoas saem da RPC para se reunirem com os seus familiares. Porém, o número de residentes da RPC que tenciona emigrar para Macau é muito superior a estes valores, pelo que são utilizados documentos falsificados na perspectiva de iludir as autoridades na concretização desse objectivo.
  ·Ordenamentos Jurídicos Diferentes
  Há cidadãos que pretendem estabelecerse em Macau para fugir às sanções legais que lhes foram aplicadas pelas autoridades chinesas, pois, de um modo geral, as sanções criminais de Macau são menos rígidas do que as da RPC. Por exemplo:para um caso de homicídio, a moldura legal em Macau é de 15 a 25 anos, na RPC é a pena de prisão perpétua ou pena de morte.

ASPECTOS CARACTERÍSTICOS DA DETECÇÃO DOS DOCUMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO E DE VIAGEM


  As modernas e sofisticadas técnicas de falsificação de documentos actualmente utilizadas implicam que, por vezes, só com exames minuciosos e feitos em laboratórios devidamente equipados e preparados para o efeito se possam detectar as irregularidades de um documento. No entanto, quando se trabalha a nível de postos fronteiriços,ter-se-á que possuir experiência e conhecimentos práticos que,complementados com o uso de equipamento adequado para o efeito, permitam,com uma margem mínima de erro, afirmar se o documento é verdadeiro ou falso.
  Seguidamente, serão abordadas algumas das técnicas e medidas de segurança utilizadas contra a falsificação de documentos, as quais tornam possível detectar as irregularidades de um documento à vista desarmada ou com o auxílio de equipamento apropriado.


  a) Processo de micro-impressão (micro-printing)
  Com este tipo de impressão, pretendese imprimir em papel adequado certos símbolos figurativos ou linguísticos, de dimensões extremamente reduzidas, mas bem claras e visíveis através de equipamentos  tecnologicamente avançados.
  Há vantagens em utilizar o processo da micro-impressão pelo facto de a mesma ser de difícil imitação ou falsificação. Tal é o caso dos símbolos e linhas utilizados,pois para os imprimir é necessário recorrer-se a equipamentos e técnicas especializadas, bem como desvendar alguns dos segredos utilizados para o efeito. A qualidade da micro-printing é tão perfeita que é incomparável com a qualidade resultante da impressão a cores.
  b) Sistema de código computarizado estabelecido pela ICAO (Internacional Civil Aviation Organization)
  A ICAO é uma organização internacional que tem como um dos seus objectivos principais analisar e estudar as medidas a utilizar contra a falsificação, propondo a sua utilização aos estados membros, bem como combater as actividades de falsificação de passaportes  e  documentos  de identificação e controlar o uso de documentos falsificados nas fronteiras.Como exemplo, poder-se-á citar o Sistema de Código que é utilizado nos actuais passaportes, que possuem caracteres que permitem a leitura óptica dos elementos de identificação do seu portador, assim como elementos do próprio documento (tais como a data de emissão e de validade), através do sistema OCR (Optical Character Recognition).
  c) Carimbos. Marcas de Ferro.Marcas de Agua. Selo Branco
  ·Carimbos  impressos  no documento.
  A possibilidade de os agentes fiscalizadores detectarem a falsidade de um passaporte ou documento de identificação fica a dever-se ao facto de saberem identificar com precisão, em cada situação, as características do carimbo verdadeiro.
  Por esta razão, é possível aos agentes detectar documentos com carimbos falsos através do método de comparação se utilizarem para o efeito o SPECIMEN do documento em análise. É recomendada uma observação minuciosa e a utilização de equipamento apropriado para analisar os carimbos em causa, pois os mesmos,uma vez falsificados,possuem um elevado grau de qualidade.
  De um modo geral, o carimbo é posto na fotografia do passaporte (ou em outros documentos de identificação)  e  na respectiva página, ficando parte do carimbo na fotografia e a outra parte na folha. A utilização do carimbo serve para evitar ou dificultar a possível substituição da fotografia, que constitui um dos métodos mais utilizados para falsificar passaportes ou outros documentos de identificação.
  Como exemplo do que acabo de referir,poderei citar uma das particularidades do Bilhete de Identidade de Residente de Macau (BIRM), o qual possui como revestimento um plástico especial. Este material contém um carimbo fluorescente onde figura a fachada de um dos monumentos de Macau. Ao plastificar-se o BIRM, o carimbo que está no plástico só não ficará danificado ou mal colocado se a plastificação realizada for exposta a determinada temperatura por equipamento adequado.
  Relativamente a certos passaportes e documentos de identificação, na generalidade dos casos, embora se consiga identificar o carimbo sob os raios fluorescentes, o mesmo não se apresenta de forma visível e nítida como o que se vê no passaporte ou documento de identificação autêntico. Em certos passaportes e documentos de identificação falsificados, o carimbo fluorescente falso é visível, mesmo sem se recorrer a utilização de equipamento especializado.
  ·Marcas de Ferro
  Esta marca costuma ser colocada parcialmente na fotografia e no impresso (página/folha) onde a mesma se encontra aposta. Esta medida de segurança está praticamente em desuso, estando a ser substituída por outras mais eficazes.
  ·Marca de Água
  Para uma percepção do que é uma marca de água poder-se-á visualizar o novo Bilhete de Identidade de Residente de Macau, emitido a partir de 2 de Janeiro de 1996, o qual contém como marca de água transparente a palavra "MACAU", escrita em Português e em Chinês, respectivamente.
  Estas marcas são produzidas através de uma tecnologia avançada, cuja falsificação não é fácil.
  As folhas interiores dos passaportes e dos documentos de identificação de vários países apresentam estas marcas de água, de forma a tomar difícil a sua falsificação. É uma medida eficaz e que possibilita aos agentes fiscalizadores identificar a falsidade ou a autenticidade dos documentos em causa através do grau de visibilidade, nitidez e características das marcas.
  ·Selo Branco
  O selo branco é um selo transparente,geralmente em relevo, carimbado nas folhas dos passaportes ou documentos de identificação. Poder-se-á visualizar no Bilhete de Identidade de Residente de Macau, emitido a partir de 2 de Janeiro de 1996, o selo branco na plastificação,evitando a falsificação e assegurando a sua autencidade. Para identificar com clareza a falsidade ou veracidade dos selos ou carimbos, ter-se-á que conhecer as características dos selos e carimbos autênticos e observar minuciosamente as particularidades dos mesmos. Por vezes, a autenticidade suscita dúvidas devido aos limites de ordem tecnológica que os falsificadores possuem para o imprimir.
  d) Plastificação do documento
  A maior parte dos documentos de identificação contém na sua superfície uma camada muito fina de plástico como uma medida de autenticidade e de antifalsificação. Por sua vez, no plástico,existe normalmente um ou mais carimbos fluorescentes.
  Por outro lado, na maior parte dos documentos de viagem, a página/folha onde constam os dados de identificação e a fotografia do titular está plastificada para evitar ou dificultar a substituição da mesma ou alteração dos dados inicialmente registados.
  Em caso de falsificação, verifica-se normalmente que o plástico, na parte da fotografia, é mais grosso, porque foi substituída a fotografia do portador autêntico por uma outra, carecendo de nova plastificação por forma a procurar manter intactas as suas particularidades.
  Se o agente fiscalizador tiver dúvidas sobre a autenticidade do documento,poderá observar os cantos da fotografia para ver se, debaixo do plástico, a fotografia está directamente colocada no impresso (folha/página) do documento ou se debaixo da fotografia plastificada existe mais uma camada de autocolante.
  e) Banda de leitura óptica
  Observando-se o verso do BIRM emitido a partir do 2 de Janeiro de 1996, visualiza-se uma banda de três linhas de caracteres de leitura óptica normalizada onde consta o número,tipo, local e data de emissão do documento e a data de nascimento,nome completo ou abreviado do titular e códigos de controlo. No entanto, esta medida de anti-falsifícação necessita de um equipamento específico para fazer a leitura dos dados.
  f) Tratamento especial da fotografia do titular (de passaportes e documentos de identificação)
  Todos os passaportes e documentos de identificação têm a fotografia do seu titular. Nalgumas situações, para dificultar a falsificação, a foto é directamente colada no passaporte e no documento de identificação e na mesma é aposto um carimbo (selos,marcas de água, marca de ferro, selo branco).
  Poder-se-á usar a técnica da termossublimação ou fotossublimação - Dye Diffusion Thermal Transfer-, conhecida por D2 T2, para colocar as fotografias nos documentos, consistindo esta técnica na tomada de imagens através de uma câmara de vídeo. Todavia,devido às características da produção da imagem, estas fotografias são particularmente vulneráveis à exposição do calor e à humidade, bem como àutilização de laminados de protecção.
  g) Cores  e  dimensão  dos documentos
  Todos os países do mundo fixam por via de legislação própria o modelo e os dados dos passaportes e respectivos documentos de identificação, bem como a cor da capa, o modelo das folhas interiores, a dimensão, os carimbos apostos e os símbolos figurativos que compõem os carimbos, para além de outras características de carácter secreto.
  h) Qualidade  dos  impressos utilizados para documentos de identificação
  Hoje em dia, quase todos os países utilizam papéis especiais, dotados de elevada qualidade e de difícil acesso,para a emissão de passaportes ou documentos de identificação. Estaprovidência, em si, já é uma medida de  segurança,  uma  vez  que,utilizando-se papel normal, estaria facilitada a falsificação do passaporte ou do documento de identificação.
  i) Impressão das letras
  Nos passaportes e documentos de identificação  são  utilizados determinados tipos de letra romanizada e/ou caracteres chineses e algarismos,por forma a dificultar ou reduzir a possibilidade da sua imitação.
  Os agentes fiscalizadores podem determinar a autenticidade ou falsidade através do reconhecimento da forma típica das letras constantes dos passaportes ou documentos de identificação autênticos. Obviamente,isto pressupõe que os agentes fiscalizadores, particularmente os agentes alfandegários, tenham um perfeito conhecimento do tipo de letras utilizado nos diferentes documentos ou passaportes.
  j) Outras medidas de segurança específicas
  Para salvaguardar a autenticidade dos passaportes e documentos de identificação,  as  autoridades competentes responsáveis pela emissão dos documentos de cada país procuram utilizar, além das medidas de segurança comuns, outras de carácter específico,para evitar a possível falsificação.
  Tendo em conta que se trata de matéria sensível, não irei enumerar algumas características particulares de alguns documentos, pois estas só são dadas a conhecer a quem tem por missão específica detectar documentos falsos,numa perspectiva de manter o sigilo das mesmas, aumentando assim a segurança do documento.

MEIOS DE DETECÇÃO DOS DOCUMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO E DE VIAGEM


  Quanto aos meios para a detecção de documentação fraudulenta, e pela descrição dos principais aspectos característicos dos documentos, poder-se-á chegar àconclusão de que a formação dos agentes fiscalizadores e a experiência são os factores principais para que se tenha êxito no desempenho da função para a qual estão vocacionados, no entanto, é imprescindível dispor-se de equipamento moderno e sofisticado para complementar e clarificar a detecção do documento falso ou contrafeito.
  a) O primeiro passo para se começar a duvidar da veracidade de um documento passa pelo contacto do passageiro com o agente fiscalizador, pois este está instruído de forma a observar se o comportamento do mesmo é normal, ou se o cidadão se apresenta nervoso. Para tal, e a título de exemplo, eis alguns dados que poderão obter-se do passageiro:
  ·verificar se o cidadão fala a língua do país de origem do documento;
  ·verificar se o cidadão possui moeda do país de origem e se viaja habitualmente;
  ·fazer algumas perguntas sobre o país do documento, como por exemplo:
  - qual a capital;
  - qual o nome do presidente;
  - outros aspectos de índole cultural e hábitos do país em causa;
  ·verificar outros documentos que possua para provar que é um cidadão do país em causa.
  b) De  seguida,  verifica-se minuciosamente o documento, devendo essa verificação incidir nos seguintes aspectos principais:
  ·verificar a compatibilidade entre a fotografia colocada no documento e o respectivo portador;
  ·verificar se o documento apresenta os aspectos característicos do verdadeiro,através da inspecção dos carimbos, das marcas de água e de ferro, do selo branco, etc.;
  ·verificar os dados pessoais do cidadão constantes no documento,como, por exemplo, a altura, a idade,a cor dos olhos e do cabelo, etc.;
  ·procurar   indícios   de duplaplastificação no documento;
  ·procurar rasuras, fundamentalmente na data de validade de documentos.
  c) No que diz respeito ao material de apoio, poder-se-á referir como imprescindível num posto fronteiriço o seguinte:
  - Nos balcões:
  ·aparelhagem de ultravioleta;
  ·leitura de sistema óptico do documento;
  ·se possível, um sistema informático com acesso a bases de dados que possuam  informação  sobre documentos  desaparecidos,roubados ou na posse de cidadãos de cariz duvidoso e perante os quais é necessário exercer apertado controlo.
  - Num gabinete, para uma análise mais minuciosa:
  ·aparelhagem de verificação de documentos que possua, entre outras características, um bom microscópio e sistemas de ultravioleta e infravermelhos. O Reino Unido, por exemplo, utiliza a UK machine readable passports (MRPs);
  ·photophone para ligação com entidades diversas e troca deinformação;
  ·sistemas  de  arquivamento automatizado de imagens, como o EDISON;
  ·uma boa base de dados, como têm,por exemplo, os holandeses, com o seu sistema VIS (Verification Information System), que possui cerca de um milhão de documentos declarados furtados ou extraviados;em Inglaterra utiliza-se o Computerised Suspect Index, cuja base de dados permite  verificar  a coincidência dos dados pessoais de um cidadão;
  ·sistema de leitura óptica que permita detectar os erros de impressão nos caracteres de leitura, bem como os dígitos de controlo.
  d) Alguns países recorrem a sistemas de leitura das impressões digitais dos seus cidadãos, para os quais possuem análise  dactiloscópica codificada, através da biometria da mão,que se fundamenta essencialmente na introdução da mão direita do cidadão numa unidade do sistema que faz a leitura das impressões dos cinco dedos.
  e) Existem também laboratórios especializados para detecção de documentos falsos com equipamentos apropriados para a análise dos mesmos,no entanto, tal operação toma-se morosa,pelo que é utilizada fundamentalmente para investigação e detecções de documentos cuja falsificação seja efectuada com meios altamente sofisticados e cujas diferenças em relação  aos  originais  sejam extremamente difíceis de detectar.
  Geralmente, os postos fronteiriços não recorrem aos laboratórios, pois o tempo que os responsáveis têm para tomar uma decisão terá que ser necessariamente curto, mesmo que dessa forma corram alguns riscos resultantes de uma análise menos sofisticada.

CONSEQUÊNCIA DA ABERTURA DO A.I.M.


  Oinício  das  operações comerciais do Aeroporto Internacional de Macau (A.I.M) tem um papel extremamente importante, nomeadamente na economia do Território de Macau. Por exemplo,Macau tornou-se independente do Aeroporto Kai Tak de Hong Kong no que respeita ao transporte de carga.Presentemente, quer produtos do sector primário quer do sector secundário, carga,ou mesmo turistas, podem entrar ou sair de Macau directamente. De ora avante,não necessitarão de passar pela cidade de Hong Kong, nem pelo Continente Chinês.Macau beneficiará, assim, de todas as vantagens e influências positivas, quer no desenvolvimento do sector do turismo,quer no desenvolvimento económico das suas capacidades como cidade internacional.
  Embora o aeroporto traga imensas vantagens ao território de Macau,aumenta simultaneamente o trabalho e a responsabilidade das Forças de Segurança de Macau, em especial no que diz respeito ao Serviço de Migração do Corpo de Polícia de Segurança Pública de Macau, cuja anterior responsabilidade englobava  apenas o controlo e administração de entradas e saídas de pessoas nos Postos Fronteiriços das Portas do Cerco e no Porto Interior - Ponte Cais N.º 14.
  Ao entrarem directamente no território de Macau, perde-se a antiga função de destilador executada pelo Departamento de Imigração de Hong Kong e da RPC.No antecedente, os turistas tinham de passar obrigatoriamente por Hong Kong ou pela China, e só após o exame dos documentos de viagem por parte de uma destas entidades é que abordavam as nossas fronteiras.
  Por exemplo, um cidadão de Singapua,para entrar em Macau antes da abertura do AIM, teria que efectuar o seguinte percurso:
  Fiscalização por parte da Companhia de Aviação - Check In
  1) Serviço de Migração de Singapura Saída do aeroporto
  ↓
  2) Serviço de Migração de Hong Kong Entrada no aeroporto
  ↓
  3) Serviço de Migração de Hong Kong Saída no Terminal Marítimo
  ↓
  4) Serviço de Migração de Macau Entrada no território de Macau
  ou
  Fiscalização por parte da Companhia de Aviação - Check In
  1) Serviço de Migração de Singapura Saída do aeroporto
  ↓
  2) Serviço de Migração da China Entrada no aeroporto
  ↓
  3) Serviço de Migração da China Saída na Fronteira Terrestre da China
  ↓
  4) Serviço de Migração de Macau Entrada no território de Macau
  Pelo exemplo exposto, poder-se-á constatar que o passaporte do cidadão de Singapura acima mencionado é verificado quatro vezes antes de chegar a Macau.
  Com a abertura do AIM, e caso o passageiro pretenda viajar directamente para o Aeroporto de Macau, não passará pela Migração de Hong Kong ou da China, caso em que o seu passaporte será apenas verificado duas vezes:
  Fiscalização por parte da Companhia de
  Aviação - Check In
  ↓
  1) Serviço de Migração do respectivo país
  Saída do aeroporto
  ↓
  2) Serviço de Migração de Macau Entrada no aeroporto
  Após este exemplo, poder-se-á verificar que poderá haver da parte dos potenciais imigrantes ilegais um aproveitamento desta situação, utilizando o AIM para passar a fronteira de Macau, uma vez que a entrada no Território se tornou mais acessível.
  De acordo com o Preliminary Passengers Forecasts, elaborado pelo Wilbur Smith Associates, em Outubro de 1995,o número de passageiros irá aumentar anualmente. Isto significa que o número de passaportes falsos utilizados por cidadãos que utilizam o AIM irá inevitavelmente aumentar, pelo que se torna imprescindível implementar medidas eficazes para conter esta tendência, fundamentais para que o AIM seja um aeroporto credível e seguro.

O FENÓMENO DO USO DE DOCUMENTAçÃO FRAUDULENTA


  E notória a grande preocupação de todos os países com a onda de criminalidade  actualmente.verificada, inserindo-se nesta área a falsificação de documentos, à qual estão geralmente associados elementos ligados à droga e ao contrabando. Para tal fim,existem redes a funcionar de uma forma integrada.
  O controlo de fronteira, apesar de acordos vários, tais como o acordo SHENGEN, é considerado fundamental para a inviolabilidade da segurança de um país ou Território, pois qualquer cidadão que entre num país de forma fraudulenta será aturalmente um potencial desestabilizador social.
  A troca de informação e intercâmbio de conhecimentos tornou-se um factor importantíssimo, contribuindo desta forma para aumentar a formação técnica do agente fiscalizador, bem como para direccionar a atenção para determinadas áreas mais vulneráveis. Para tal, realizam-se periodicamente conferências e reuniões com a presença de vários países para se debater o assunto e se proporem novas medidas e meios de combate aos falsificadores de documentos. Nestas conferências,geralmente são também apresentados novos equipamentos, meios tecnológicos e sistemas integrados de informática que possibilitem e facilitem o trabalho realizado ao nível de fronteira,assegurando uma informação integrada e completa.
  É relevante mencionar alguns aspectos e factos que comprovam a complexidade e incremento deste fenómeno:
  - Esforços concertados das autoridades para combater as redes de auxílio àimigração ilegal nas suas vertentes:angariadores, passadores, facilitadores e alojadores.
  - Papel de Moscovo e Praga como plataformas de trânsito de ilegais provenientes, designadamente, da R.P. da China, Somália, Etiópia, Angola,etc., estimando-se que em Moscovo circulem actualmente cerca de 100.000 imigrantes ilegais a aguardar o seu encaminhamento para diversos destinos.
  -No que respeita à China, é assiduamente mencionada a existência de movimentos migratórios internos de norte para sul do Território, com o apoio das comunidades secretas que incentivam a emigração ilegal.
  - Preocupação dos Países em trabalhar de forma integrada as diversas vertentes securizadoras dos documentos, a saber:
  ·protecção física contra falsificações e contrafacções;
  ·leitura óptica dos documentos através de sistema apropriado;
  ·optimização do processo de emissão de documentos.
  - Apoio permanente dos diversos ramos policiais aos serviços com responsabilidade de controlo de fronteira.
  - Periodicamente, faz-se um balanço dos países cujos documentos apresentam maior número de falsificações e contrafacções, as quais incidem fundamentalmente na substituição da fotografia, alteração de dados biográficos, utilização de folhas genuínas furtadas em branco e anomalias na estrutura do documento,tornando difícil concluir se foram subtraídas ao controlo de qualidade ou desviadas do circuito de destruição de documentos reprovados.
  - Um assunto que preocupa igualmente os países, fundamentalmente os que possuem melhores condições sociais,é o abuso do estatuto de asilo, bem como aspectos jurídicos ligados àimigração ilegal e ao repatriamento de candidatos ao asilo para o respectivo país de origem.
  - O excesso de permanência em determinado país ou território e a chegada de clandestinos por via marítima que assíduas vezes destroem os seus documentos é outra realidade.
  - O tráfego de cidadãos chineses é, de momento, poder-se-á afirmar comtoda a certeza, uma das preocupações de inúmeros países, desde o continente americano (E.U.A. e Canadá),passando pela Europa e estendendose à Austrália.
  Para fazer face ao tráfego de cidadãos ohineses e ao aumento da criminalidade entre esta comunidade,têm sido constituídos grupos de trabalho que se debruçam sobre:
  ·o crime organizado de origem étnica chinesa;
  ·tríades chinesas;
  ·tríades vietnamitas;
  ·organizações criminais japonesas.
  Os maiores problemas surgem na Europa de Leste, por onde passa grande parte do tráfico de ilegais, verificando-se um elevado índice de actividades criminais. Como causa desta situação, são apontados os seguintes aspectos:
  ·motivos económicos;
  ·escasso risco de detecção, devido ao pouco zelo e formação dos funcionários de fronteira dos países do leste;
  ·inexistência de legislação que tipifique o crime de auxílio àimigração ilegal.
  No que diz respeito ao trajecto utilizado para atingir o objectivo, poder-se-á também afirmar que os países do leste funcionam como plataforma de trânsito (cabeça de serpente).
  Habitualmente, os estrangeiros ilegais saem do país de origem munidos de passaporte, ainda que fraudulentamente emitido, ou entram ilegalmente num Território onde recebem um documento de viagem falso. A estes cidadãos chineses são, por vezes, fornecidos documentos de cidadãos da mesma nacionalidade já residentes nos países de destino.
  A criminalidade organizada na comunidade chinesa abrange o auxílio àimigração ilegal, à prostituição, àexploração de casinos, ao tráfico de estupefacientes, etc., mantendo contactos fundamentalmente com as mafias russa e italiana.
  A destruição de documentos a bordo por parte de cidadãos que, depois de embarcarem com um documento falso, o eliminam durante o trajecto ou mesmo durante a passagem pela zona de trânsito de um aeroporto, por forma a serem considerados indocumentados no local de destino, é outra forma de actuação que está a preocupar as autoridades.
  Outra estratégia passa pelo envio por correio, através de embalagens, de documentos que, na generalidade dos casos, são falsos ou roubados e que são enviados para posterior uso, numa perspectiva de o seu portador conseguir entrar no país de origem do documento.As autoridades do Canadá estão a dedicar grande atenção a este assunto, criando para o efeito legislação própria que permita às autoridades responsáveis revistar as embalagens que levantem suspeitas.
  Por norma, os cabecilhas dos grupos ligados à falsificação de documentos possuem agências de viagem ou restaurantes nos países de destino do cidadão a quem fornecem o documento,têm a sua rede montada nesses países,sendo os citados locais as sedes camufladas dos negócios ocultos que efectuam.

CONCLUSÕES


  ·Procurei neste artigo sensibilizar as pessoas para a importância de que se reveste o assunto, de forma a manter a integridade e estabilidade social de um país, para o que se torna imprescindível a detecção e proibição de entrada de cidadãos que procuram fraudulentamente entrar no mesmo, bem como descobrir os tentáculos das tríades existentes e respectivas áreas de actuação.
  ·O controlo de fronteira constituiu-se como essencial para a inviolabilidade da segurança de um Território, pois qualquer cidadão que entre num país de forma fraudulenta será naturalmente um potencial desestabilizador.
  ·Para tornar possível um controlo eficaz a nível de fronteira, e tendo em conta o aperfeiçoamento por parte dos falsificadores na feitura de documentos,ter-se-á que utilizar documentos altamente seguros, equipamentos de detecção adequados e tecnologia de ponta,para além de dotar o pessoal que está vocacionado para o controlo dos documentos de conhecimentos técnicos e científicos compatíveis com a especificidade da função  que desempenham.
  ·Para contrariar a actividade das redes de auxílio à imigração ilegal, é importante e fundamental que se concretizem as recomendações das conferências sobre a matéria realizadas em Berlim e Budapeste, nomeadamente no que se refere a:
  - realização de seminários para formação de pessoal encarregado do controlo fronteiriço;
  - harmonização de documentos de identidade e de viagem, apelando-se veementemente para se proceder a um rigoroso controlo da qualidade dos mesmos e à sua emissão centralizada;
  - previsão e punição do crime de auxílio à imigração ilegal na legislação dos diversos países;
  - troca de informações entre os pontos de contacto;
  - aceitação dos imigrantes ilegais pelos países de origem;
  - readmissão dos imigrantes ilegais pelos países de trânsito.
  ·Dever-se-á encarar os falsificadores como um temível inimigo, pois estes utilizam toda a sua imaginação e conhecimentos para adulterarem os documentos através da alteração de dados,da substituição da fotografia e da falsificação de vistos, utilizando para o efeito fotomontagens elaboradas porfotocopiadoras  associadas  a microprocessadores de grande qualidade.
  ·Para fazer face ao mencionado no ponto anterior, as autoridades de cada país procuram munir-se de documentos altamente seguros, socorrendo-se de tecnologia mais avançada quer no equipamento, quer na qualidade do material utilizado, o qual obedece às seguintes características principais:
  - alto nível de segurança;
  - respeito pelas normas preconizadas pela International Civil Aviation Organization (ICAO);
  - potencialização da qualidade em prol do preço unitário do documento;
  - protecção do documento contra a sua reprodução/imitação, fotocópia,alteração de dados pessoais;
  - uso de equipamento de elevada qualidade para a emissão e controlo de documentos, cedendo-se aos fabricantes os novos tipos de imitação, falsificação ou alteração dos documentos detectados;
  - personalização dos documentos;
  - utilização de material altamente resistente, incidindo a sua concepção nos seguintes aspectos:
  ·textura;
  ·uso de laminados de protecção de elevada qualidade;
  ·reacção a diluentes e produtos químicos;
  ·marcas de água;
  ·filetes de segurança;
  ·marcas com reacções diversas a diferentes tipos de luz e não reprodutíveis em fotocopiadoras;
  - constituição de bases de dados e equipamento de comunicação que permitam a troca de informação relativa aos cidadãos.
  ·Geralmente, os cidadãos que utilizam documentos fraudulentos procuram munir-se de documentos de países com índices de segurança mais elevados e que suscitam menos suspeitas,como o Japão, a Coreia , Singapura, os EUA, o Canadá, etc..
  ·Verifica-se grande preocupação dos diversos países com o afluxo de cidadãos da RPC possuidores de documentos falsos e procura-se estudar em pormenor as rotas utilizadas pelos mesmos. Cito, a título de exemplo, a seguinte rota e aspectos significativos na conduta dos cidadãos em causa:
  - O cidadão sai da RPC para Moscovo, uma vez que não necessita de visto de entrada para efectuar esta deslocação; em Moscovo recebe um documento de viagem fraudulento; efectua a viagem geralmente via Frankfurt ou Bilbau;destes locais, procura chegar a Portugal e daqui, por exemplo, aos E.U.A.
  - Os cidadãos chineses geralmente efectuam a sua viagem em grupo de 3 a 4, sendo na sua maioria do sexo masculino, e dedicam-se a negócios (restaurantes, agências de viagem)que iludem outros fins e actividades em que estão envolvidos.
  - Os passaportes coreanos e japoneses que foram encontrados na posse de chineses apresentam com grande frequência visto e counterfoils falsos supostamente emitidos nos E.U.A.
  ·Para cidadãos provenientes dos países asiáticos, ter-se-á que ter em conta não só a falsificação dos documentos mas igualmente a utilização de documentos que não pertencem ao portador. No entanto, devido à semelhança na fisionomia dos cidadãos em causa, esta situação é possível, daí a importância de se solicitar ao passageiro o seu BI, de forma a confrontar o mesmo com o seu documento de viagem.
  · Assume aspecto relevante o papel desempenhado pelas autoridades competentes, nas zonas de trânsito dos aeroportos, para os chamados passageiros em órbita, na detecção de cidadãos que procuram destruir o seu documento de viagem, ficando na situação de indocumentados, o que geralmente ocasiona consequências graves para os países onde tal situação ocorre.
  ·Por último, uma referência àabertura do AIM, que poderá realçar as vulnerabilidades que eventualmente existem no controlo fronteiriço em Macau, situação para a qual, as autoridades  responsáveis  estão naturalmente atentas, procurando dotar o seu pessoal dos conhecimentos necessários para fazer face às dificuldades com que se debate o funcionário de fronteira, em resultado do elevado número de documentos de identidade e de viagem em circulação,cada um com as suas próprias características bem como disponibilizar material adequado ao desempenho desta complexa e importante tarefa para defesa da integridade do Território de Macau e do bem-estar da sua população.

  *Major de Artilharia.Adjunto do Chefe do Serviço de Migração.