DISCURSO DO JUIZ-DESEMBARGADOR,DR.LUÍS MENDONÇA DE FREITAS,NA CERIMÓNIA DA TOMADA DE POSSE COMO ALTO COMISSÁRIO CONTRA A CORRUPÇÃO E A ILEGALIDADE ADMINISTRATIVA


  Minhas Senhoras e meus Senhores:
  Permita-me Vossa Excelência, Senhor Governador, que as minhas primeiras palavras sejam para sublinhar e agradecer a confiança em mim depositada, e agora materializada neste solene acto de investidura em tão exigente cargo, confiança que procurarei não desmerecer, embora saiba as dificuldades que me aguardam.
  Macau é hoje uma dinâmica e rica sociedade, humana e sociologicamente complexa, a viver um período único da sua história. A transição política, um rápido crescimento económico e a diversidade de interesses pessoais e de grupos são factores propiciadores de condutas que podem ser lesivas dos interesses gerais do Território e das suas comunidades.
  Será, assim, em defesa da legalidade, da estabilidade social e de uma correcta prestação administrativa que todas as estruturas especialmente vocacionadas devem conjugar meios e esforços para combater o fenómeno da corrupção, que é hoje, em todas as sociedades, um mal que afecta os próprios fundamentos do Estado.
  Refiro-me, concretamente, aos serviços fiscalizadores da Administração, às autoridades de investigação criminal, com especial relevo para a Polícia Judiciária, ao Ministério Público, como titular da acção penal, e, em particular, ao Alto Comissariado contra a Corrupção e a Ilegalidade Administrativa.
  Mas esse combate terá que ser feito no absoluto respeito dos princípios que regem uma sociedade democrática, com salvaguarda dos direitos e liberdades fundamentais, designadamente pela intervenção do poder judicial sempre que possam estar em causa valores que contendam com a esfera de liberdade pessoal de cada um, com ao seu bom nome e reputação.
  Como magistrado, sei bem o alcance e significado dessa protecção.
  Reconheço igualmente que, pelas suas causas múltiplas, o fenómeno da corrupção exige uma intervenção multidisciplinar.
  Desde logo, dos órgãos políticos que definem o quadro sancionatório necessário a uma prevenção especial e dissuasora de comportamentos com relevância penal e disciplinar. Depois, pela disponibilização dos meios necessários a um combate eficaz. Por último, pela simplificação dos mecanismos administrativos que facilitem a rápida e justa resolução das pretensões dos particulares junto da Administração.
  É minha firme convicção que os órgãos do Governo do Território estão seriamente empenhados em reforçar e aprofundar as condições que viabilizem um combate eficiente e coordenado às práticas lesivas dos interesses colectivos e da própria imagem de Macau.
  Com a aprovação do Código do Procedimento Administrativo e, recentemente, do Código Penal, o Território fica dotado dos instrumentos legais indispensáveis a um enquadramento moderno das práticas de maior incidência no domínio da ilegalidade administrativa e da corrupção activa e passiva no seio da Administração Pública, num quadro de regulação de novos procedimentos e responsabilidades dos agentes administrativos e em novas tipologias criminais, com agravamento sensível das penas relativas aos delitos de corrupção.
  Tenho, porém, consciência de que a eficácia da luta contra a corrupção passa, em primeira linha, pela sensibilização dos residentes quanto aos seus direitos na sociedade e à necessidade de uma colaboração responsável e sem constrangimentos com os organismos envolvidos.


  Na minha actuação funcional, respeitarei, sem excepção, o quadro de competências que a lei me confere, mas recorrerei às indispensáveis colaborações por parte das entidades de investigação e judiciárias, e em particular ao Ministério Público, no âmbito das respectivas atribuições.
  Afirmo, assim, o meu intransigente apego à lei, à justiça, mas também à prudência, que na minha condição de magistrado judicial tenho feito por honrar.
  Tenho por mim que o valor da justiça material implica, antes de mais, a defesa de um núcleo reservado de qualidades e possibilidades de agir atribuídas pelo Direito à pessoa humana.
  Esta preocupação tem de estar sempre presente no ideário das instituições que desejem manter e proteger uma efectiva harmonia das regras de convivência comunitária, que justificam todos os projectos de vida em sociedade.
  Anima-me um sincero entusiasmo quanto aos desafios inerentes às funções nas quais Vossa Excelência, Senhor Governador, acaba de me investir. Delas não dissocio aquilo que sou e em mim conhecem os que me têm acompanhado no Território.
  Estou certo de que, com a ajuda de todos, conseguirei realizar os desígnios comuns dos que vivem por, e para Macau.
  Bem hajam.